Vipassana, um maravilhoso despertar.

Nesses últimos 11 dias estive completamente offline. Sem noticias do mundo afora, inclusive sem falar e evitando ao máximo qualquer tipo de contato com outros seres humanos. Restou apenas eu, comigo mesma, eu, minha mente sob controle e todas as sensações que meu corpo pudesse captar.

Isso é um resumo da meditação vipassana.

Durante as práticas, consegui reproduzir em meu corpo, sintomas que, se eu contasse para algum médico, dependendo da minha idade e história de vida, eu poderia ser diagnosticada com alguma doença para a qual existiria uma droga para tratamento.
Sensações de formigamento criadas que surgiam no corpo aonde eu colocava a minha atenção, dores no coração que irradiavam para o ombro, calor, frio, pulsação, percepção de expansão de membros e flutuação. Coisas que possivelmente me levariam, se os exames solicitados fossem normais, ao diagnóstico de uma doença mental.  Então seria uma epidemia de loucos. Pois, os mais diversas sensações foram relatadas por todos os mais de 100 participantes do grupo que conseguiram levar o curso até o fim.

Em vipassana não se pode usar drogas. Nem álcool, nem cigarros, nem remédios para dormir.

Durante 10 dias, é comum pessoas que usam essas drogas, largarem seus vícios para sempre. Há relatos também de cura de doenças. E é isso que me interessa.

A intensa imersão  em vipassana nos faz realizar, ao nível da experiência, a realidade da interação mente e corpo. É essa interação que, quando geramos apego ou aversão aos estímulos que entramos em contato durante a vida, nos faz adoecer.
Esta é a razão mais profunda da origem do adoecimento humano. A verdade de que criamos nossas próprias doenças e sofrimento. E se não a tratarmos no nível mais profundo, nos mantemos viciados em remédios para o resto da vida,  achando que a culpa do que nos acontece está afora ou então que é genético e, portanto, imutável.

Depois de tudo que tenho observado nas minhas buscas sobre as origens do adoecimento humano, já não é mais possível separar medicina de espiritualidade.
Digo espiritualidade, não religião. Digo em aceitar a existência de algo para além desse mundo material e de admitir que isso muitas vezes possa ser fundamental para o sucesso terapêutico.

Reconheço que a maioria de nós não tem força mental para suportar as dores pelo corpo resultado de estar imóvel por 1 hora seguida e seguir uma rotina de uma rotina diária de 10 horas de meditação, entre as 4 da manhã até as 21h. Mas quem encara o desafio e o completa, esteja seguro de que certamente mudará o rumo de sua vida.

Encontrei em vipassana um excelente recurso terapêutico no despertar da consciência. Algo fundamental para que as pessoas parem de achar que o que precisam seja uma pílula para emagrecer e outra para dormir e que continuem no ciclo de frustração pelos desejos não realizados e reação a tudo que lhe acontecem de ruim. Vipassana, acima de tudo, é uma técnica que auxilia os seres humanos a alcançarem uma vida sem sofrimentos.

Vipassana é de graça. Existe em mais de 100 centros no mundo e vive de doações.

No Rio de Janeiro, o Centro Dhamma Santi está localizado em Miguel Pereira

Inscrições no site: https://www.dhamma.org/pt/

 

A arte de não julgar

Um dia desses eu estava conversando com uma pessoa muito querida sobre as aparências. Como todos nós julgamos e estabelecemos nosso nível de relacionamentos tendo como referência a posição social.

E a pessoa me disse:

– Mas eu trato todas as pessoas de forma respeitosa e igualitária.

Foi quando eu retruquei:

– Não estou me referindo a como você trata as pessoas, e sim ao que você pensa delas e aos critérios utilizados para estabelecer os níveis de relacionamento.

No post anterior, falei, entre outras coisas, sobre a origem do conteúdo dos pensamentos.  Pensar ou não pensar diante de uma situação é o que diferencia o nível da impulsividade do nível do julgamento. A maioria de nós, seres humanos, passa a vida oscilando entre esses dois níveis de consciência que vão definir (e limitar) as nossas possibilidades de escolhas do dia-a-dia.

Por séculos, as regras de conduta estabelecidas pelas religiões e tradições mantiveram a ordem entre os indivíduos de uma sociedade. Contudo, ainda no século XIX,  filósofos, como o francês Emilie Durkheim, já estavam preocupados em como manter a integridade e coerência das sociedades em uma Era moderna (nós, atualmente), em que as religiões e tradições perderiam suas forças.

Durkheim foi um dos pioneiros da sociologia e quem cunhou o termo consciente coletivo, por ele definido como o ‘conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade’.

O consciente coletivo, do qual fazem parte os valores morais, somados às nossas experiências individuais, são as informações inconscientes responsáveis pela formulação de um pensamento, no nível do julgamento ou da própria atitude,  ao nível da impulsividade.

Na verdade, não há muita diferença entre esses dois níveis, já que tanto o pensamento quanto a ação são referenciadas pelos mesmos padrões inconscientes. Contudo, estamos mais propensos a errar (entende-se por errar aquela atitude contraditória ao senso comum) quando agimos sob o nível da impulsividade, o que ocorre com facilidade quando experienciamos uma emoção negativa.

A essência desse conhecimento já foi extensivamente estudada e utilizada para os mais diversos fins. Edward Bernays, pioneiro das relações públicas e propaganda disse:

“Se entendermos os mecanismos e motivação da mente grupal, seria possível controlar as massas de acordo com a nossa vontade sem que elas saibam? as práticas recentes de propaganda mostra que isso é possível …”

A compreensão desses mecanismos de funcionamento da mente podem ir mais além do que sua principal função atual: a exploração egoísta do ser humano.  Para mim, o estudo da mente e emoções me trouxe a um outro nível de compreensão do que é a vida e me motivou a explorar os processos inconscientes que ditam não só as minhas emoções e pensamentos, mas também a integridade do meu corpo físico.

Por isso, auto-cura e auto-conhecimento, dois termos tão mal compreendidos, relacionam-se mutuamente. Trazer ao conhecimento os processos inconscientes que originam nossos pensamentos, emoções e atitudes evitam a repetição de padrões deletérios que, em última grau, serão responsáveis pelo adoecimento do corpo.

Esse estado de observação de si é o terceiro nível de consciência que descreverei: o nível da auto-observação.

Quando estamos nesse nível, há uma certeza de que você é algo a mais do que seus pensamentos.  Você começa a querer entender por que está pensando de uma forma ou de outra.  Observa também as emoções. Mas sem nomeá-las, pois atribuir significado às coisas é função da mente. Emoção apenas é sentida.

Embora o senso comum seja uma grande referência para nossas atitudes, o nosso imaginário é uma terra sem lei. Não há ninguém além de nós mesmos para regular o conteudo dos nossos pensamentos.  A auto-observação dos pensamentos, das emoções e das funções do corpo físico é o objetivo de quem acessou este nível de consciência. Este é o ponto de partida para a verdadeira manutenção da saúde e auto-cura.